terça-feira, 26 de junho de 2007

As três árvores - lenda popular

No cimo de uma montanha nasceram um dia três pequenas árvores. Nos primeiros tempos eram tão frágeis e verdes, que se confundiam com a erva e as flores que despontavam à sua volta.
Mas, Primavera após Primavera, o seu pequeno tronco foi ficando cada dia mais robusto. E enfrentavam corajosamente os desafios outonais e invernais, que as fortaleciam ainda mais. Do cimo da colina contemplavam o mundo e sonhavam no que seriam quando fossem grandes.
A primeira árvore olhava para as estrelas que brilhavam como diamantes incrustados no vestido negro da noite. E disse:
— Eu, acima de tudo, gostaria de ser bela e de guardar um tesouro. Desejaria ser coberta de ouro e conter pedras preciosas.
A segunda árvore contemplava o rio que descia serpenteando a montanha e abrindo caminho em direcção ao mar. A água corria por entre os seixos e ninguém a podia parar. E disse:
— Eu desejaria ser forte. Ser um grande barco! Navegar nos mares imensos e transportar capitães e reis poderosos. Ser o galeão mais forte do mundo.
A terceira árvore contemplava o vale que se entendia aos pés da montanha e olhava para a cidade lá ao longe, onde se movimentavam as pessoas. E disse:
— Eu não quero deixar esta montanha. Quero crescer tanto, que as pessoas parem a olhar para mim. Elas, erguendo os olhos para o céu, pensarão em Deus. Serei a maior árvore do mundo!
Passaram os anos. Caíram as chuvas e as pequenas árvores tornaram-se três árvores altas e imponentes.
Um dia, três lenhadores subiram à montanha com os seus machados a tiracolo. Um deles observou bem a primeira árvore e disse:
— É uma bela árvore! É perfeita.
Passados poucos minutos, depois de algumas machadadas desferidas no seu tronco, a primeira árvore caiu ao chão. Pensou então: “Agora estou para me transformar num magnífico cofre”.
O segundo lenhador olhou para a segunda árvore e disse:
— Esta árvore é vigorosa e sólida. É precisamente a que eu procuro. Levantou o machado, que brilhava ao sol, e abateu a árvore.
A árvore pensou: “Serei uma nave importante. Navegarei nos vastos oceanos!”
A terceira árvore sentiu a respiração a faltar-lhe quando o lenhador a fixou. Este disse:
— Para mim qualquer árvore serve.
Ergueu o machado e, pouco tempo depois, também a terceira árvore jazia no chão.
Os seus belos ramos, que até há pouco serviam de abrigo aos passarinhos, foram cortados um a um.
Os três troncos, cortados, rolaram pela encosta abaixo até à planície.
A primeira árvore exultou quando o lenhador a levou a um carpinteiro. Mas o carpinteiro não tinha precisamente a ideia de fabricar cofres. Com as suas mãos calejadas transformou a árvore numa manjedoira para animais. A árvore, que era outrora tão linda, não foi revestida de lâminas de ouro nem coberta de jóias. Foi cheia de feno para alimentar os animais famintos da quinta.
A segunda árvore sorriu quando o lenhador a levou para um estaleiro naval, mas naquele dia ninguém pensava em construir um veleiro. Com grandes golpes de martelo e com a serra, a árvore foi transformada numa simples barca para pescadores. Muito pequena, muito frágil para navegar nos oceanos, a barca foi levada para um lago. Todos os dias transportava carregamentos de peixe, que a impregnavam de um cheiro desagradável.
A terceira árvore ficou muito triste quando o lenhador a partiu para fazer toscas traves, que guardou no pátio da sua casa. A árvore perguntava:
— Por que me sucede isto? Tudo o que eu queria era estar erguida no cimo da montanha e convidar as pessoas a pensar em Deus.
E recordava o tempo em que lutava com o vento no alto da montanha.
Passaram-se muitos dias e muitas noites. As três árvores quase que esqueceram os seus sonhos.
Mas, uma noite, a luz dourada de uma estrela acariciou com os seus raios a primeira árvore, precisamente no momento em que uma jovem mulher com infinita ternura depositava na manjedoira o menino acabado de nascer.
O seu marido murmurou:
— Teria preferido fazer-lhe um berço.
A jovem mãe sorriu e respondeu:
— Esta manjedoira é magnífica.
Naquele momento, a primeira árvore compreendeu que continha o tesouro mais precioso do mundo.
Passaram-se outros dias e outras noites. Uma ocasião, um viajante cansado e os seus amigos embarcaram num velho barco de pesca, que outrora tinha sido a segunda árvore.
Enquanto a segunda árvore, feita barca, deslizava tranquilamente nas águas do lago, o viajante adormeceu.
De improviso, depois de um raio acompanhado de forte trovão, desencadeou-se a tempestade.
As ondas do lago eram alterosas e a pequena barca tremeu. Sabia que não tinha força para transportar, são e salvo, a tantas pessoas com aquele vento e com a violência daquelas ondas.
Preocupados, os amigos acordaram o misterioso viajante. O homem levantou-se, estendeu os braços, gritou ao vento e disse às águas do lago:
— Acalmai-vos!
A tempestade parou imediatamente e fez-se uma grande bonança.
Naquele momento, a segunda árvore percebeu que estava a transportar o rei dos céus, da terra e dos mares infinitos.
Pouco tempo depois, numa sexta-feira de manhã, a terceira árvore ficou muito surpreendida quando as suas toscas traves foram tiradas da arrecadação de madeira. Foram transportadas para o meio de uma multidão irada, postas às costas feridas de um homem, que depois foi nelas crucificado. A pobre árvore sentiu-se muito mal. Chorava ao segurar aquele pobre corpo ensanguentado.
Mas no Domingo de manhã, quando o sol se elevou nos céus e toda a terra vibrou de uma alegria imensa, a terceira árvore soube que o amor de Deus tinha transformado tudo.
Tinha feito da primeira árvore o maravilhoso cofre do mais terno e incrível dos tesouros: o menino Jesus. Tinha feito da segunda árvore um portador do Filho de Deus através do lago. E todas as vezes que uma pessoa pensasse na terceira árvore, em forma de cruz, pensaria imediatamente no Céu.
E isto era muito melhor do que ser apenas a mais bela, a mais forte e a maior árvore do mundo.

Pedrosa Ferreira
Histórias com sumo
Porto, Edições Salesianas, 1995

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